Imóvel em construção pode ser considerado bem de família, conforme entendimento do STJ

O fato de o devedor não residir no único imóvel de sua propriedade, em razão deste estar ainda em fase de construção, não impede que este seja considerado bem de família. É o que decidiu, de maneira unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial n.º 1.960.026-SP.

A Quarta Turma do STJ cassou acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu ser impossível a caracterização de imóvel em construção como bem de família.

O caso que ensejou o julgamento do colegiado teve origem em execução de título extrajudicial, em que foi determinada, em 1ª instância, a penhora de imóvel em construção de propriedade de um casal de idosos. O TJSP, em sede de 2ª instância, também concluiu pela penhorabilidade do terreno com edificação inacabada, sob o fundamento de ser imprescindível à proteção legal conferida ao bem de família pela Lei n.º 8.009/1990 que o imóvel sirva de efetiva e atual residência aos devedores.

No Recurso Especial, os recorrentes pleitearam pela impenhorabilidade do imóvel em construção, sob o argumento de que se trata de sua futura moradia.

Para a Quarta Turma, diferentemente do entendimento do TJSP, não é determinante para concluir se determinado imóvel é bem de família o fato de o devedor não residir no único imóvel em que é proprietário.

Importante destacar que a impenhorabilidade do bem de família é direito fundamental. O relator do caso, ministro Marco Buzzi, em seu voto, defendeu que "a impenhorabilidade do bem de família busca amparar direitos fundamentais, tais como a dignidade da pessoa humana e a moradia, os quais devem funcionar como vetores axiológicos do nosso ordenamento jurídico".

Continuou o seu voto defendendo que a interpretação conferida ao instituto - bem de família - deveria ter suas exceções interpretadas restritivamente, pois o amparo legal visa assegurar a proteção da entidade familiar, e não do devedor, motivo pelo qual deve ser feita com a subsunção do fato à norma.

Assim, obra inacabada presume-se residência e será protegida, pois a interpretação finalística e valorativa da Lei n.º 8.009/90, considerando o contexto sócio-cultural e econômico do País, permite concluir que o imóvel adquirido para o escopo de moradia futura, ainda que não esteja a unidade habitacional pronta - por estar em etapa preliminar de obra, sem condições para qualquer cidadão nela residir -, fica excluído da constrição judicial (penhorabilidade).

Por fim, o relator esclareceu que cabe ao tribunal de origem analisar as provas sobre o preenchimento dos requisitos legais para configuração do bem de família, não cabendo, portanto, ao STJ reconhecer diretamente a impenhorabilidade do imóvel. No caso concreto, nem todos os requisitos foram examinados anteriormente, motivo pelo qual os autos retornaram ao TJSP para reexame do recurso interposto contra decisão de primeiro grau proferida. Desta vez, no entanto, deverá ser afastada a obrigatoriedade de residência no local como condição essencial ao reconhecimento do bem de família.

Thiago Iunes