A adjudicação compulsória extrajudicial introduzida pela Lei nº 14.382/22
A aquisição de um imóvel se confirma com o registro de sua transferência junto ao Cartório de Registro de Imóveis. E, para que essa transferência se formalize, faz-se necessário um título passível de registro, como por exemplo uma escritura pública de compra e venda.
Ocorre que, em diversos casos, há como ato antecedente à escritura pública de compra e venda a celebração de compromisso de promessa de venda e compra, através do qual o promitente comprador se compromete a realizar o pagamento do preço e o promitente vendedor, por sua vez, se compromete a outorgar a mencionada escritura. Com a outorga da escritura, o promitente comprador deve se dirigir ao Cartório de Registro de Imóveis competente a fim de registrar o título – que transfere a propriedade do imóvel – na matrícula imobiliária.
No caso de compromisso de venda e compra de imóvel que foi celebrado em caráter irrevogável e irretratável, tendo sido quitado o preço em sua integralidade, o promitente comprador poderá exigir do promitente vendedor a outorga da escritura pública. Se houver recusa por parte do promitente vendedor, o promitente comprador pode requerer, judicialmente, a adjudicação do imóvel, servindo a sentença de procedência como título apto para a transferência da propriedade.
Importante mencionar que não se exige, para o exercício da ação de adjudicação compulsória, a prévia averbação do compromisso de venda e compra perante a matrícula imobiliária. Esse entendimento foi sedimentado com a edição da súmula nº 239 do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
Sumula nº 239, STJ: O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
Com a promulgação da Lei nº 14.382/22, nasceu a possibilidade de a adjudicação compulsória ocorrer pela via extrajudicial, não se limitando à atuação do Poder Judiciário para que o registro de transferência junto ao Cartório de Registro de Imóveis se materialize. Trata-se, portanto, de grande avanço para a desjudicialização, trazendo uma maior eficiência na prestação jurisdicional.
A referida Lei introduziu o art. 216-B na Lei dos Registros Públicos (Lei nº 6.015/73), que trouxe os requisitos para o procedimento extrajudicial de adjudicação compulsória.
Primeiramente, deve ser apresentado ao oficial do registro de imóveis o compromisso de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso. Como mencionado acima, o compromisso deve ter sido celebrado em caráter irrevogável e irretratável. Em outras palavras, não pode haver a possibilidade de arrependimento do negócio jurídico.
O segundo requisito que deve ser cumprido é a prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos.
Posteriormente, caberá ao tabelião de notas lavrar ata notarial da qual constem a identificação do imóvel, o nome e a qualificação do promitente comprador ou de seus sucessores constantes do contrato de promessa, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar ou receber o título de propriedade (no caso, a ausência do vendedor na data e horário estabelecidos).
Além disso, deverão ser providenciadas certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação.
Por fim deverão ser apresentados comprovante de pagamento do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e procuração com poderes específicos.
Estando todos os documentos em conformidade com as exigências legais, o oficial do registro de imóveis procederá o registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título o compromisso de promessa de compra e venda ou de cessão ou o instrumento que comprove a sucessão.
A inovação legislativa trazida pela Lei nº 14.382/22 vai de encontro com o movimento de desjudicialização ou extrajudicialização que vem ocorrendo na justiça brasileira. Descentralizar certos procedimentos incumbidos ao Poder Judiciário e transferi-los a órgãos extrajudiciais acarreta a redução de custos para as partes envolvidas e, em tese, menor tempo para resolução de conflitos.
Thiago Iunes